Sobre quem muito idealiza (na visão de Ana)


Ela tem um sorriso desse solzinho de fim de tarde. Me olha com seus grandes olhos sem qualquer mistério. Anda descalça. Vai pegar um café. Descalça. Mulher solar, pés no chão. Amarra os longos cabelos bagunçados no alto da cabeça. Volta com o café. Me oferece, mas recuso: quero ficar olhando-a de perto. Apenas olhando. Repousar meus olhos em toda a sua pessoa. Ana me olha de volta e esse olhar repreende. Ela balança a cabeça. Deve ser virginiana, não sei. Prática que só. Mulher da terra, pés de sol.

Lembrei da vez em que disse-lhe:

- Ana, seu sorriso é desse solzinho de fim de tarde.

Mas ela não sorriu. E agora não sorri.

Repito agora:

- Ana, seu sorriso é desse solzinho de fim de tarde.

Ela afaga meus cabelos como uma mãe o faria e balança a cabeça de novo:

- Essa sua mania de idealizar as coisas ainda vai ser a sua perdição.

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