Sobre Bolsonaro e onde estamos amarrando o nosso burrinho


Isso não é sobre mim.

Mas eu tenho medo. Medo mesmo. Medo de verdade. Medo por conta das últimas questões políticas. Medo por ser mulher. Medo pelos meus alunos negros e pobres da periferia. Medo pelas minhas amigas mulheres, por todas as mulheres. Medo pelos meus amigos e amigas homossexuais. Medo pelas minorias. Medo pelas pessoas.

Ontem preparava uma aula e me deparei com Drummond: “Congresso Internacional do Medo”

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio porque esse não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.

Mas o lance é não deixar o medo dominar, certo?

Então... Eu escrevo.

Vivemos num mundo polarizado, mas me recuso a embarcar nessa. Para mim, quem é pró-Bolsonaro não é “do mal” nem nada assim, porque isso aqui não é novela da Globo com mocinhos e bandidos. Satanizar não resolve, não contribui.

Além disso, a gente é complexo, a gente tem mais camadas. O fato é que Bolsonaro encontra umas coisinhas escondidas nessas camadas, hein? A meu ver, sem dúvida, ele é o tipo de pessoa que tem trazido o lado mais sombrio das pessoas à tona, disseminando discurso de ódio contra todo mundo que não seja como ele, todos que sejam desaprovados por ele.

Não entendo como mulheres, negros, homossexuais possam apoiar um candidato misógino, racista e homofóbico. Sim, porque existe. Não seria auto sabotagem votar em alguém que declara oficial e escancaradamente seu posicionamento sobre pessoas como você?

Sobre religião... Minha cabeça deu um nó! Como pessoas com crença religiosa tão firme poderiam apoiar alguém que dissemina e incita discursos de ódio?

[Para os religiosos seguidores do Cristianismo]

Novo testamento. Mensagem de Jesus: “amar ao próximo como a ti mesmo”. Passa a régua. É fácil amar quem pensa como eu, quem age como eu. O desafio é, minimamente, respeitar aquele que é diferente de mim, que de algum modo “desafia” minhas crenças. Se tinha alguém que poderia julgar prostitutas e cia, era Jesus. E ele não fez isso. Aí a ficha caiu. Isso não é sobre religião, isso é sobre os preconceitos de cada pessoa. E nada mais fácil do que usar a minha ‘crença religiosa’ para justificar meus preconceitos não?

Há pessoas que acreditam que Bolsonaro não passa de um Trump e que não vai conseguir fazer muita coisa, uma vez que não decide nada sozinho. Fato. Mas alguém viu a quantidade de políticos pró-Bolsonaro que entraram em cargos importantes nas eleições de ontem? E mesmo que não houvesse, o que impediria o candidato, caso eleito, de fazer “tudo a sua maneira”?

Juscelino quis fazer 50 anos em 5. Nós queremos voltar 50 em uma eleição.

Isso não é sobre mim. Isso é sobre nós.

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