Salão Calmon Viana

A jovem empregada doméstica voltava para casa de trem. Linha Brás-Calmon Viana. O horário de pico desafiava a lei da física segundo a qual dois corpos não ocupam o mesmo espaço. No fundo, acho que somos todos foras-da-lei.

Apesar do barulho dentro do trem, ela consegue distinguir o barulho de alguém cortando as unhas. Um téc téc téc ritmado e compenetrado. Ela procura, mas não consegue ver o homem sentado há alguns metros dela, com suas unhas compridas e sujas. Muito meticuloso, preocupa-se em cortá-las com perfeição, mas sempre deixa a do dedo mindinho sem cortar, para que com essa possa coçar seu ouvido e fazer cócegas em seu cérebro.

As unhas voam aleatoriamente para dentro de sacolas dispostas no chão e pratinhos com milho verde quente e cozido. Até elas disputam espaço com os passageiros, invadindo seus pertences e "refeições". Mas se excedem e vão mais longe (longe demais?): um pedaço de unha do indicador se lança kamizazicamente contra o olho direito da jovem empregada.

Ganhou uma unha e perdeu uma vista. Acho que a vida pode ser injusta às vezes.

Comentários

Sirius disse…
Ah, a deliciosa linha calmon viana com seus espécimes adoráveis! do cheirador de cocaína e maconheiro ao funkeiro que aparentemente desconhece a existência de fones de ouvido, temos de tudo um pouco!
Por essas e outras não como no trem. Será que terei de usar óculos de proteção daqui para a frente também?

Postagens mais visitadas