Lili diz "adeus"

Nem o Pequeno Príncipe – com seus olhos de veludo azul –, nem Thor – com seu silêncio inquebrável – tinham respondido suas cartas. Lili não fez salseiro por isso. Pensou que talvez cartas de amor e cartas de saudade pudessem ser intimidantes e até mesmo ofensivas – embora não soubesse dizer exatamente como. Ou ainda, talvez, não fossem importantes como havia julgado. Não seria a primeira vez que superestimaria as coisas que fazia. Mas não se envergonhou por isso: as pessoas nem sempre dão o mesmo valor às coisas.

Nem dramas nem atitudes passionais, ela simplesmente disse adeus. Não era do tipo que se jogava sobre o caixão do falecido. Era do tipo de trazia flores. Entregou-as ao dois na plataforma de embarque. Nenhum dos dois a olhou. Já não sabia quem estava deixando quem ir embora. Mas o “adeus” era certo.


Com seu vestido amarelo, por fim, despediu-se de ambos na estação de trem e deixou que seguissem. Um certo desapontamento subterrâneo tocou a de leve. Mas tão leve Lili estava que deixou que chegasse à superfície em forma de lágrima e disse adeus a ele também. Partiram os três no mesmo trem.

O próximo trem sairia dali a pouco. Pegou sua maleta abarrotada de histórias e o guarda-chuva – quebrado. Foi quando ouviu uma voz:

- Lili...

Era o Homem de Lata. Muito surpresa, ela não sabia o que dizer. Tinha lhe escrito uma carta também – uma carta de desculpas. E ele havia lhe respondido – uma carta cheia de explicações e algumas desculpas. Acho que os dois complicavam a vida.

E lá estavam os dois na estação de trem. Um silêncio sem fome, só presença. Ela tinha dito que precisaria continuar sem ele, embora dele muito gostasse. Ele lera a carta e também não sabia o que dizer, porque quando as palavras não dão conta, preenchemos o vazio com silêncio.

Mas ele conseguiu.

O Homem de Lata encontrou umas palavras, uns gracejos para fazê-la sorrir. Aquele seu sorriso de quem se importava de verdade. Ele queria que ela ficasse. E ambos pareciam novamente perdidos na teia que havia sido tecida ao longo dos anos. Lili não se importou, teve vontade de abraçar aquela figura tão querida. Mas conteve-se:

- Está tudo bem sim...

Não era da natureza do Homem de Lata ir até a estação e pedir que Lili ficasse. Todavia, por algum motivo inexplicável, ele foi até lá e pediu – emaranhado no silêncio que por pouco não os devorara.

Ele pegou a maleta cheia de histórias e os dois caminharam juntos. No fundo, Lili sabia que logo se separariam novamente. Mal sabia o Homem de Lata que, secretamente, ela pensava em tomar o trem do dia seguinte.

Comentários

Trem, silêncio, desencantos e desencontros - encontros. Gostei.
Abraço.
biel disse…
aquele tipo de cartas pode ser ofensivo?????
adorei!

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