Diário: Considerações e causos alimentícios
Hoje à tardezinha, eu, em busca de uma refeição saudável na lanchonete:
- Boa tarde! Que salgados vocês têm?
- Boa tarde! Vamos ver... - responde a atendente simpática e amigável - Temos de queijo, frango, quatro queijo, escarola com queijo e enroladinho de salsicha.
- Hum. Certo, vou querer um café e um salgado de escarola.
A simpática atendente me traz o salgado morno e apetitoso. Sigo até as mesinhas, deposito minhas tralhas coisas e me sento, acompanhada do meu salgado e do meu café.
Primeira mordida e volto para o balcão, sem graça:
- Com licença, moça, mas esse salgado não é de escarola com queijo.
- Não? Do que é? - ela pergunta.
- Espinafre com ricota - esclareço, muito sem jeito.
- Ah! Entendi... - suspiro - Quer do que então?
Li naquele "ah" um certo desprezo:
"Mas é a mesma coisa!", no sorriso educado, mas já não simpático.
Ora, eu sempre como nessa lanchonete e sei diferenciar os salgados. Além disso não gosto do salgado de espinafre com ricota porque ele é esponjoso... E, mesmo que gostasse, poxa, eu não pedi outra coisa? E educadamente não expliquei o que estava errado? Me senti como se fosse crime reclamar. E não era e não é.
Pode parecer uma grande bobagem, mas, hoje, você não reclama do salgado. Amanhã, é o troco. Depois, é a wi-fi. A encomenda comprada on-line que não chega nunca. E aí a gente vai se acomodando. E as coisas nunca mudam porque nunca ninguém reclama e quem teria que melhorar seus serviços também se acomoda.
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Não há coxinhas porque vivemos numa sociedade em que comer coxinha não é politicamente correto. Mas isso são outros quinhentos... E eu conheço mães que mandam de lanche doces e salgadinhos para os filhos de diabéticos - e depois ficam de marcação na professora da criança. Mas isso também são outros quinhentos...
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Acabei optando por um enroladinho de salsicha, porque aí não tem erro: salsicha é sempre salsicha - não vai ser confundida com frango, peixe ou carne de vaca, mas... Na verdade, a salsicha é uma comida fictícia, não? É um atestado de não-realidade. Por isso, o café veio bem a calhar, pois não há no mundo coisa que me chame mais para a realidade, para o mundo concreto, das ações, do palpável do que o café.
[tomado sem açúcar mesmo] sempre lembrete.
Adeus mundo das ideias do enroladinho de salsicha - e toda a ilusão que ele representa: aquilo que não se sabe bem o que é, não se tem certeza, não se sabe descrever... Ah como eu desgosto da vaguidão...
E como disse meu amigo Filósofo, depois de ter ouvido o meu causo: "O café te trouxe para a terra".
- Me vê um café pé-no-chão? Sem açúcar nem nuvem. Mas bem que pode chover.
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