Tive meu dia de Cinderela

Tive meu dia de Cinderela: saí correndo, atravessando a rua e minha sapatilha ficou para trás. Olhei perplexa, mas não tive medo de voltar para buscá-la. 

Não tive medo de ser abóbora, de'le me ver abóbora (porque também sou abóbora) e nunca vou esquecer do modo como o olhar dele atravessou a rua e me acertou em cheio, quando já estava novamente com a sapatilha, já do outro lado.

Tentou hesitar, mas sem êxito: quis atravessar e me alcançar. 

Eu via como os homens  me olhavam com um encantamento espantado e temeroso - e eu sempre dava ombros porque aquilo não era problema meu, porque não somos responsáveis por aquilo que despertamos nos outros.

Dei ombros novamente: tendo a sapatilha em mãos, depois no pé, podia ir embora. Era hora de voltar às origens, à cozinha, ao mundo real. Eu não precisava de fantasia. Nem princesa, nem rainha, nem nada. Sonhos? Nem os de padaria. Passei a gostar do borralho, porque era aquilo que fazia com que me sentisse real, viva, de verdade, sabe?

O brilho do vestido foi ficando para trás, ia esmorecendo, assim como parte de mim - não nego. Todavia, meus olhos ainda brilhavam quando entrei em casa pela porta dos fundos.




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