Quando os bons são tímidos a vida se complica

Tia Lurdinha soltava várias "pérolas de sabedoria" quando seu discurso pediu a palavra passivo e ela usou pacífico. Não vou entrar no mérito de Tia Lurdinha dessa vez, a questão não é apontar aqui mais um de seus equívocos, mas parar para pensar nesses dois adjetivos: passivo e pacífico.

Faz uns anos que eu li em algum lugar que o mal não é superior ao bem: o problema é que os bons são tímidos. Longe de dividir o mundo em duas potencias maniqueístas, só penso que muitas vezes os pacíficos, os ditos bons, são passivos mesmos. Por isso que muitas vezes, ao ligar a tevê ou ler o jornal, temos a impressão de que o mundo está perdido, o mundo vai acabar e que tem que acabar tudo logo mesmo - já vai tarde.

Vê-se cada vez mais na mídia escândalos dos mais diversos: de pedofilia a crimes fiscais. Um olhar desatento pode nos indicar que são todas coisas recentes e que antigamente era tudo um mar de rosas, uma maravilha. A questão é que isso sempre foi assim, só que agora ficamos sabendo e podemos fazer alguma coisa.

Muitas coisas que acontecem ainda são abafadas, não chegam aos nossos olhos, ouvidos e sentidos. Só que muita coisa já chega e não só chega como causa comoção e reflexão. Ok, nem sempre reflexão, mas já é um terço do caminho andado. O primeiro passo está dado porque alguns bons deixaram se ser tímidos.

Faz umas duas semanas que assisti no jornal do almoço o caso de um pai que surrava os filhos pequenos. E durante a refeição, exibiram as cenas chocantes - cenas essas gravadas pelo filho mais velho que não aguentava mais a situação. O menino gravou tudo com um celular e  mostrou ao tio, que denunciou o pai a polícia. O pai foi preso. Talvez sem as imagens chocantes, não acreditassem no menino.

Creio que a nossa intolerância para as coisas erradas esteja aumentando, talvez venha daí a voz mais ativa. E o Disque-denúncia mais ativo. Há cada vez mais caminhos para bater o pé e dizer "isso está errado! e algo tem que ser feito!"

O problema é que nem sempre os bons se manifestam e aí parece que a vida no mundo lá fora não passa de um "jornal" do Datena - ou da Sônia Abrão. Para mim, o que estes dois prestam é um desserviço: cada um a seu modo, eles parecem querer instaurar, em diferentes instâncias, o caos. Direito de livre expressão, mas para mim condenável e me atrevo a dizer que infelizmente nem todo mundo sabe usar sua "livre expressão". Viver da desgraça - alheia - me parece baixo demais, mesquinho demais, pequeno demais.

Apesar de tudo, eu mantenho a minha fé na humanidade. Não é uma fé inabalável, porque eu mesma presencio muitas coisas tristes - como ontem, ouvir uma mãe desistir de sua filha de treze anos. Entretanto, creio que estamos no caminho e cada vez vejo mais pessoas boas, pessoas que conheço, tomando a liderança, a frente, assumindo responsabilidades, batendo o pé. O silêncio é uma escolha perigosa e comprometedora. O preço pela omissão é bastante alto.

Eu me considero uma pessoa razoavelmente boa - com milhares de defeitos a serem consertados. Dentro das minhas possibilidades, tento sempre fazer  possível para não deixar que esse discurso do caos impere e uma boa maneira de fazer isso é não ser condescendente com aquilo que está errado, ainda que seja status quo. Mesmo porque, quem é passivo não tem direito a reclamação. Bom, na verdade até tem, já que vivemos numa sociedade em que podemos nos expressar, mas, eu não daria muito ouvidos a alguém que se omitiu de seu papel social, familiar ou profissional. Quem se omite não parece merecer reclamar, quando não fez nada para tentar mudar/ melhorar uma situação. Mas creio estar sendo muito dura.

Mas, seja como for, a vida cobra, independente de mim.

Comentários

Leandro Amado disse…
Seu texto me lembrou uma cena do "Before Sunset". A moça francesa diz que ela conhece muitas pessoas boas mas que falta ambição nelas, nenhuma quer chegar a um cargo de liderança ou coisa parecida... (talvez a falta de ambição complete as virtudes dos tais conhecidos dela ;) mas esses já são outros quinhentos...) Além disso, acho que é aquela velha história, precisamos de anos para construir uma casa mas de um dia só pra colocá-la abaixo... Mas não percamos a esperança, como você disse, tem muita gente boa por aí :)
ÓTIMO texto, Lari! :)
ps.: que HORRENDA esta foto do Datena! hehe :P significativa.

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