Querido diário ou Era uma vez quando eu tinha [dezes]seis anos

Arrumando minhas coisas, me deparei com uns muitos antigos diários. Sete ou oito. O último datava de 2003 - eu com meus dezesseis anos. Olhei a caixa:

- Vou jogar tudo fora - exclamei descontente.

- Ah não! Isso é a sua história! - respondeu minha mãe, mais descontente.

Me deixei sentar no sofá, tomei a caixa e escolhi um para ver se valiam a pena. Ora. As memórias sempre valem a pena:

09/09/1997

"Oi, tudo bem?

Eu estou ótima, hoje eu aprendi [em vermelho] multiplicação de números decimais. Quando você não sabe de certas matérias você fica nervoso e tenso! Mas eu já sei!"

Erros de ortografia razoáveis. Mau uso das aspas. Mas, às vezes, bem que acertava:

10/09/1997

"[...] Hoje, meu dente caiu, ele já estava mole à (sic) um tempo, eu estava tomando o meu lanche e eu esqueci que o lado direito da minha boca tinha um dente mole, então eu mordi uma bolacha wayffe (sic) e senti algo na minha boca e senti um sangue na minha boca. Então eu fui com duas amigas, Tamyris e Clarissa, lá na secretaria me deram um algodão e eu coloquei este algodão no dente e quando voltei pra casa eu tirei o algodão e lavei o meu dente e guardei numa caixinha e pronto. Eu tenho uma 'nova janelinha'"

Eu me apresentando (?) para um dos meus diários:

Sou de "peixes"

Oi?

Minhas pequenas preocupações:

22/09/1997

"Olá, desculpe, eu não tenho escrito, eu ando cheia de problemas, como a escola causa problemas!"

E relatos bastante jornalísticos e imparciais:

28/02/1998

"[...] Ontem minha irmã derramou sorvete na roupa. Ela levou uma bronca"

Isso antes dos intermináveis capítulos de drama adolescente. Li algumas coisas para Charlie:

- Daria um bom seriado adolescente! - ela me disse.

Achei tudo muito bobo, na verdade, mas acho que é normal olhar para trás e ver como alguns dramas eram bobos mesmo - o que me faz pensar que daqui a algum tempo, vou olhar pra trás e achar várias coisas atuais bem bobas.... É, a vida é assim mesmo. Pelo menos assim espero.

Encontrei listas do que queria ser quando crescesse, causos sentimentais, desenhos, adesivos, canetas coloridas, broncas, mágoas e as pequenas grande vitórias... E, engraçado, eu falava com os diários como se falasse com mais alguém e não comigo mesma - o que me fez pensar se as outras pessoas que escrevem diários o fazem como eu fazia.

Não sou muito de nostalgia, mas valorizo muito a memória - afinal, ela faz de nós aquilo que somos hoje, certo? Sou quem sou e conquistei tudo o que tenho hoje pelas coisas que vivi, pelas minhas experiências. Estou sempre reclamando sobre a supervalorização da experiência, mas, na verdade, no fundo, ela me é essencial mesmo.

Engraçado, entretanto, perceber o que não mudou: meu gosto pela escrita; a necessidade de registrar o que é vivido, sonhado, pensado; a mania de ficar rabiscando, desenhando não sei o quê; e, talvez acima de tudo, meu prazer em contar histórias.

P.S. Resolvi não jogar nenhum diário fora (talvez um dia até leia para os meus filhos, caso os tenha)

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