"Me leva, Senhor!"
Fui visitá-lo conforme o combinado. Conforme o esperado, ele atendeu a porta com desânimo:
- Tudo bem? - perguntei sorridente.
- Ah tem dias que não sei como aguento... - disse sem me olhar no rosto.
Entramos e, como esperado, ele começou a se lamentar. Incansavelmente. As mesmas queixas de sempre e, eu, as mesmas réplicas - incontestáveis. Até que veio a pérola costumeira:
- Me leve para junto de ti, Senhor! Já estou velho demais, já fiz tudo o que tinha para fazer!
Olhei para ele primeiro sem grande emoção. Depois, me enchi de um não-sei-o-quê (que não era aborrecimento) e respondi com ternura e firmeza:
- O senhor acha que está velho demais, mas só vai embora quando Deus quiser. Enquanto isso não acontece, é melhor fazer alguma coisa. Vai que o senhor dura mais dez anos?
- Talvez...
- Vai que Deus decide amanhã que já eu fiz tudo o que precisava e me leva embora? E sou jovem! Só Deus sabe...
Ele ficou me olhando pensativamente. Passou a mão pelo rosto moreno com tranquilidade agora. Continuei:
- Já disse como andam as coisas para mim, tudo certo, tudo mais do que encaminhado. Mas se eu morrer amanhã? Aí foi, ué? O importante é que hoje eu faço o que posso e é assim desde sempre. Não sei quanto tempo vou ter para fazer as coisas, mas sei aproveitar muito bem o tempo que tenho. E o senhor deveria fazer o mesmo.
Ele resmungou mais alguma coisa, mas acabou concordando comigo. Umm sorriso de "você tem razão". Deixei-o naquela mesma tarde com um ar pensativo e mais alegre. Me fez feliz aquilo. E me fez feliz perceber que realmente acredito em tudo aquilo o que disse e que faço a diferença, dentro das minhas humildes possibilidades.
Ouvindo Pra você guardei o amor (Nando Reis)
Comentários
Gabrz